Posted on 24/02/2020 by Ana Cristina Da Costa Diniz

Aparigraha ou o não apego, um caminho a seguir. O encanto subjacente ao Yoga


Aparigraha ou o não apego, um caminho a seguir. O encanto subjacente ao Yoga

Encanta-me o Yoga e cada vez mais. É uma prática, uma filosofia, uma sabedoria infindável e para quem gosta de aprender, tem efetivamente um mundo que se pode abrir à sua frente.

Serve para nos tornarmos cada vez pessoas melhores, equacionar conceitos, aceitar limitações, valorizar quem realmente somos. É um laboratório onde podemos fazer inúmeras experiências, desejando que a vida seja longa e que tenhamos a flexibilidade de apreender e agradecer.

Encanta-me, igualmente, acreditar que o Yoga é muito mais do que simples posturas físicas, que de simples também pouco têm, pois em cada uma delas um mundo se pode abrir. Ora nos conectamos com a nossa respiração, que nos guia e sempre lá estará para nós, sendo tudo o que basta para a nós sempre regressarmos e observarmos quanta vida, quanta força temos, que nos temos a nós próprios e que connosco podemos contar. Ora trabalhamos a estabilidade, a força, o equilíbrio, a harmonia, ou até mesmo, através da energia dos mantras veiculada pela nossa voz, também a nossa vibração interior é limpa, arejada, melhorada.

Contudo, apesar de essas tais posturas físicas – os ásanas, serem um universo em si mesmo, encanta-me particularmente saber que temos mais por onde trepar. Com tempo!

Existe uma escritura, os Sutras de Patañjali, que, de acordo com o seu estilo clássico se diria que foram compiladas entre os séculos III e V d. C., mas o seu conteúdo indica uma compilação que aponta para os séculos IV a.C. Esses Sutras são aforismos do Yoga, máximas de Yoga reunidas com base em resumos de debates seculares entre sábios e yogis, entre filósofos e praticantes de Yoga. Essa obra dita que são 8 os passos para a realização do Yoga: os yamas (5 princípios éticos para com a comunidade onde nos inserimos), os nyamas (outros 5 princípios éticos para connosco próprios), pratyahara (a abstração dos sentidos), os ásanas (posturas físicas), pranayamas (controlo da respiração, da energia vital), dharana (concentração), dhyana (meditação) e samadhi (iluminação).

É minha pretensão abordar um pouco um dos yamas, nomeadamente Aparigraha. Este termo traduz-se comumente como não apego, não possessividade. É um conceito que se pode aplicar a várias situações na vida; não significa o apego saudável a quem amamos, por exemplo, não é desse apego que se trata, mas sim dum apego mais desmedido e obstinado por coisas materiais, que ilusoriamente pensamos que nos trazem estatuto, ou até um apego doentio a um companheiro amoroso ou a um filho a querer tornar-se independente. Na verdade, muitas vezes se concluí que sempre que tentamos apegar-nos fortemente a algo, seja possessividade pelo companheiro ou até apego à nossa juventude ou aos filhos, isso só conduz à destruição dessas mesmas coisas que valorizamos e até à destruição da nossa essência, do nosso Eu mais profundo.

Ora, é aqui que pretendo chegar e ao analisar a minha vida profissional (fora do contexto do Yoga) , concluo que a tenho vivido com muito sofrimento, em parte porque efetivamente se pode dizer que houve e há injustiças, mas também foi uma vida sofrida pelo meu apego à ideia de que as situações teriam ou deveriam de ser como eu considerava justo. E como tal, trabalhava dedicada e afincadamente (e acho que sempre assim trabalharei) só que paralelamente sofria pois esperava um outro resultado das ações muito melhor do que aquele que tinha. E isso é apego aos resultados das ações!

Hoje compreendo que também isso trouxe sofrimento, perda de liberdade e de felicidade. Uma vez reconhecido isso, tentarei daqui para a frente praticar Aparigraha, ou seja o não apego pelo resultado das ações. Simplesmente agir e fazer o meu melhor e depois deixar ir, largar o resultado. Singelamente ser, sem medos e pouco esperar, na verdade também de pouco ou nada serve esperar algo, pois as coisas acontecem quando e a quem tiver de acontecer.

Eu acabava por construir imagens de como as situações deveriam ser e ficava presa a esse raciocínio e ao que vivenciava e considerava injustiça.

Mais uma vez o Yoga, com os seus ensinamentos, está sempre presente. Se Yoga é chitta vritti nirodha, sendo chitta a mente, vritti instabilidade e nirodha significa supressão, hoje em dia procuro isso mesmo e aos poucos tento a supressão da instabilidade da mente. 

Aparigraha é um caminho a seguir e contribuí para a liberdade e paz na mente e como tal no nosso Ser, e felizes e libertos seremos seres muito melhores e faremos todos à nossa volta bem mais felizes.

Cristina Diniz

Março 2017


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